Sim. Sou preto. Não moro e nem nunca morei em favela. Meu pai era metalúrgico

e conseguiu dar a minha irmã e também para mim uma vida digna e nos colocava pra estudar em boas escolas particulares. Nessas escolas tinham uns 600 alunos por período e dentre eles apenas uns 7 pretinhos. Éramos ponto de referência. Todo mundo sabia quem era a gente. Normalmente eu era o único negro da sala. Isso nunca me incomodou tanto pois isso também era comum onde eu morava. Meu bairro não tinha muitos negros. Sempre vivi num ambiente com poucos negros. Na escola sofri racismo várias vezes quando pivete. Não sabia lidar direito com aquilo a não ser na porrada. Se não me respeitavam, ao menos me temiam.
Também sofri aquele racismo que brancos acham que não é racismo e não adianta tentar explicar pq nunca vão entender.
O racismo mais clássico acontecia quando eu era mais novo com uns 20 anos, quando as pessoas atravessam a rua achando que você vai roubar elas. Aconteceu algumas vezes. Numa dessas vezes aconteceu algo inusitado. Eu estava indo a noite pela calçada e a mulher vindo de encontro e eu percebi o desespero dela achando que eu iria roubá-la. A mulher atravessou a rua sem nem olhar pros lados e um carro pegou ela. Se arrebentou toda. O motorista parou e eu fui lá ver também se podia ajudar em algo. Enquanto o motorista ligava pro resgate eu falava com ela no chão tentando acalma-la. A mulher nem conseguia olhar pra minha cara e eu percebi que ela estava envergonhada. Quando o motorista voltou e fui embora e ela agradeceu pela ajuda.
Por viver num ambiente tão "branco", acabei me casando com uma mulher branca. Teria sido mais fácil pra muitas coisas se eu tivesse casado com uma negra que tivesse passado por coisas semelhantes as que eu passei, mas a opções eram poucas no meu circulo social e as boas pretendentes já estavam comprometidas. Felizmente minha mulher é compreensiva quando surgem alguns impasses devido a sermos um casal interracial.