Tem muitas... mas segue uma que gosto muito:
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Só a leve esperança, em toda a vida,
disfarça a pena de viver, mais nada:
Nem é mais a existência, resumida,
que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
sonho que a traz ansiosa e embevecida,
é uma hora feliz, sempre adiada
e que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos
árvore milagrosa, que sonhamos
toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim : mas nós não a alcançamos,
porque está sempre apenas onde a pomos
e nunca a pomos onde nós estamos.
Vicente de Carvalho
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Hoje
Eu partirei
Peço perdão neste instante
Por estar indo embora
Assim tão de repente
Desta vez os lábios
Se abrem
Para lhe dizer:
“Até mais
Nunca esquecerei-me de você”
Não pare
Tenho que ir
Logo dirão:
“Ele era bom, mas lhe faltava tato”
O empobrecer de cada despedida
É o que me torna de fato
Um arquiteto de ruínas
Que mede, pesa
Qualquer movimento
De ninguém
Alguém me explica, por favor
Quem foi que me roubou o amor?
Porque eu, hoje
Não me permito estar indiferente à dor
Não quero dizer adeus
turvo turvo
a turva
mão do sopro
contra o muro
escuro
menos menos
menos que escuro
menos que mole e duro
menos que fosso e muro: menos que furo
escuro
mais que escuro:
claro
como água? como pluma?
claro mais que claro claro: coisa alguma
e tudo
(ou quase)
um bicho que o universo fabrica
e vem sonhando desde as entranhas
azul
era o gato
azul
era o galo
azul
o cavalo
azul
teu cu
tua gengiva igual a tua bocetinha
que parecia sorrir entre as folhas de
banana entre os cheiros de flor
e bosta de porco aberta como
uma boca do corpo
(não como a tua boca de palavras) como uma
entrada para
eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida
com seu montão de estrelas e oceano
entrando-nos em ti
bela bela
mais que bela
mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era…
Perdeu-se na carne fria
perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia
Do meu amado Bertolt Brecht, "Perguntas de um Operário que Lê":
Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilônia, tantas vezes destruída,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China,
para onde foram os seus pedreiros?
A grande Roma está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu?
Sobre quem triunfaram os Césares?
A tão cantada Bizâncio
Só tinha palácios
Para os seus habitantes?
Até a legendária Atlântida,
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as Índias
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua Invencível Armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos.
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitória...
Quem cozinhava nos festins?
Em cada década um grande homem...
Quem pagava as despesas?
Está sem mulher,
Está sem carinho,
Está sem discurso,
Já não pode beber,
Já não pode fumar,
Cuspir já não pode,
A noite esfriou,
O dia não veio,
O bonde não veio,
O riso não veio
Não veio a utopia
E tudo acabou
E tudo fugiu
E tudo mofou,
E agora, josé?”
Mas o poema que eu gosto mesmo é do “batatinha quando nasce”.
Eu já esqueci você
(tento crer)
Nesses lábios que meus lábios sugam de prazer
Sugo sempre,
Busco sempre,
A sonhar em vão
Cor vermelha,
Carne da sua boca,
coração.